sábado, 12 de março de 2011

Garotos perdidos

Nós corríamos por aquela grama de plástico, onde eu não tinha sentimento de culpa por pisar. Dentro da redoma onde brincávamos, um campo de relva artificial com uma árvore de brinquedo no meio, jovem como nós, dois galhos, uma folha em cada um, e nossa dúvida se ela cresceria. Eu estava de olhos estendidos,  molhados como se tivessem orvalho, entre as nuvens de giz de cera e as folhas de borracha que naquele dia pareciam novas. Nós aprendemos a amarrar gravetos e colar papéis, compramos tudo na mesma loja e desempacotamos como o manual mandava, felizes pelos gravetos terem vindo em sacos-bolha.
Eram tempos frios dentro e fora da nossa redoma, tínhamos o toque úmido e o olhar gélido, ao sermos postos ali congelávamos o nosso tempo, as imagens passavam  muito devagar em dias que acabavam muito rápido. Estávamos sempre correndo, mas sempre por perto, ao redor da árvore e eu não sei o que nem se havia algo além de até onde fui. Sabia que o céu era uma pintura mais próxima do que parecia, isso já era o suficiente. Não gostava de brincar com as vacas de papel que pastavam ali, o que elas falavam me deixava triste e eu não criava intimidade se achasse que alguém era mais velho para conversar comigo, as duas estavam sempre ali, mas não conversei  mais que alguns bons dias até que amarelassem e começassem a rasgar nas bordas.
Eu queria me amarrar em uma daquelas pipas, como todos os outros fizeram, mas nas quedas e nos machucados deles, eu encontrei minha justificativa. Um de nós se prendeu num nó no segundo galho da árvore e já que nunca mais cairia, cortamos a sua corda para que finalmente voasse. Aqui estou eu, hoje, visitando seu desenho no topo da redoma, meus olhos estendidos às incontáveis folhas de borracha da nossa árvore agora gigante o suficiente para tocar o céu e borrar uma nuvem.

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