terça-feira, 22 de junho de 2010

Você

Você me viu passando e nada fez, você, essa vergonha e inatitude. Por causa de você ele voltou para casa e escreveu e no dia seguinte nada mais daquilo fazia nenhum sentido porque nada nunca faz. Você, a segunda pessoa do meu dia e da minha língua, minha realidade, que descende de tu e se perde entre eles. Tocou meus dedos por acidente naquele dia e nunca mais, mas aqui está. E é tarde demais. Você agora é outro, por isso sou outro e assim continuamos sob sucessivas transmutações como se nos tornássemos líquido e recipiente, barro quente e mão.

Entenda.

Você acordou naquele dia como acorda todos os dias mas o dia só começou algum tempo depois. Você olhou o espelho e viu ele, viu eu. Você vestiu-se de acordo e saiu. No caminho esbarrou comigo, vestido de você e isso foi apenas uma vez, pois meu eu e seu eu são raros de se ver. Eu ainda esbarraria com muitos de você. Depois de mim um primeiro ele também vestido de você, falando com a sua voz:
- Quem é você?

Quem é você afinal? Quem sou eu? Há muito tempo não me vejo e duvido se existo.

- Você sou eu...

Quem é ele? Ah, ele. Ele é tudo que há de pior e de mais belo, é tudo que quisermos que seja.

- Mas quando olho, o que vejo sou eu.

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